Olá, gente...
Gostaria de
compartilhar com vocês o texto abaixo da autoria de Renato Carvalho, o que considero importante e impertinente.
Carta à minha
filha: Não deixe que a escola te ensine.
“Clarice querida,
O mundo está mudando
rápido. Bem mais rápido que as nossas escolas. Há tantas delas que ainda não
perceberam que este mundo internético em que hoje vivemos é radicalmente
diferente do mundo desconectado de algumas poucas décadas atrás e que nossa
Educação agora pode e precisa ser muito melhor.
Grandes ideias não faltam: escolas na nuvem
na Índia, aulas sem turmas nem professores em
Portugal, salas-de-aula invertidas nos Estados
Unidos, brinquedos que
ensinam crianças a programar computadores na Inglaterra, milhares de pessoas do mundo todo fazendo juntas
cursos de nível superior!
Mas é preciso querer ver a necessidade de mudar, e isso demora. Por mais
que eu esteja otimista, não acho que os anos que te restam na escola sejam
tempo suficiente para essa onda de renovação se espalhar pelo Brasil e chegar à
tua sala-de-aula.
Vai ser por pouco… Você é parte da última geração de alunos da escola do
passado. Ou seja, alunos de um modelo de educação igualzinho ao que eu tive, e
que também foi o mesmo dos teus avós, teus bisavós, teus trisavós…
Mas se não dá para evitar que as manhãs da tua infância sejam gastas em
aulas chatas e desestimulantes, você pode pelo menos ficar alerta aos defeitos
desse modelo. Assim, enquanto você aproveita o que a escola pode te oferecer de
bom, vai conseguir impedir que ela te ensine algumas coisas que a mim custaram muitos anos para desaprender.
Não deixe que a escola
te ensine que conhecimentos podem ser compartimentados, separados em caixinhas,
isolados uns dos outros.
Na escola do passado, a matemática acaba quando começa a física e a
geografia acaba quando começa a história. No mundo, há biologia no esporte,
matemática na música, história na literatura, gramática na programação de
computadores… Por isso, depois de ver algo de perto, dê sempre um passo para
trás, perceba as relações, enxergue o todo.
Não deixe que a escola te ensine que alguns conhecimentos são mais
importantes que outros.
Na escola do passado, para cada aula de artes há duas de geografia e
para cada uma de geografia há duas de matemática. Música, artes plásticas,
esportes, religião, filosofia são tratados como matérias de “segundo time”.
Quantos grandes artistas e esportistas foram vistos como maus alunos e forçados
a abandonar seus talentos porque o conhecimento que lhes interessava não era o
mesmo que interessava à escola! Persiga teus interesses mesmo que eles não
interessem a mais ninguém.
Não deixe que a escola te ensine que há um momento específico para
aprender cada coisa.
Na escola do passado, quem não consegue acompanhar a turma é tido como
um fracassado e quem quer avançar mais rápido é freado, impedido. Ela exige que
todos aprendam o mesmo ao mesmo tempo. Mas as pessoas não são todas iguais.
Você pode ter mais facilidade que os colegas em um determinado assunto e menos
em outro. Não deixe que te empurrem nem que te segurem. Respeite teu próprio
ritmo de aprendizado.
Não deixe que a escola te ensine a decorar.
Ao contrário, esqueça tudo que puder. O homem dominou o planeta porque
foi capaz de fabricar ferramentas que estenderam os limites das nossas mãos e
pés. Agora, fomos ainda mais além e fabricamos ferramentas que estendem os
limites do nosso cérebro. Não precisamos mais desperdiça-lo usando-o como um
depósito de nomes, datas e fórmulas; hoje podemos aproveitar todo o potencial
dele para analisar, criticar e refletir o mundo de informações que podemos
acessar com um clique. A Internet é o teu HD, o cérebro é o teu processador.
Não deixe que a escola te ensine a te contentar com pouco.
Na escola do passado, as consequências de tirar nota 10 ou nota 7 são as
mesmas. O aluno excelente passa de ano da mesma forma que o mediano, com, no
máximo, um elogio da professora. Assim, aos poucos os alunos vão ficando
satisfeitos em “passar por média”. Nunca fique contente com a média. Dê teu
melhor sempre, em tudo o que fizer (inclusive nesses poucos anos que ainda te
restam na escola do passado). No mundo, ao contrário da escola, a excelência
faz muita diferença.
Não deixe que a escola te ensine a acreditar que ela é suficiente.
A escola do passado lamentavelmente abdicou da missão de preparar os
alunos para o futuro e se limita a tentar prepará-los para o vestibular ou o
ENEM. Mas a tua vida produtiva começa exatamente depois desse ponto e para ser bem
sucedida nela você precisará de muito mais do que ciências, matemática,
português, história e geografia.
O futuro vai exigir que você tenha uma boa
noção dos teus direitos e deveres para cumprir teu papel de cidadã, conheça um
pouco de economia para saber gerenciar teu dinheiro, aprenda sobre
empreendedorismo para fazer tuas ideias virarem realidade, tenha consciência
global para compreender teu lugar no mundo, domine a Internet enquanto
ferramenta de comunicação e muito mais. Há muitos conhecimentos que não estão
na escola. Procure-os onde estiverem.
Não deixe que a escola te ensine que provas são capazes de medir a tua
capacidade e inteligência.
A história está repleta de gênios que foram tidos como maus alunos. Eles
eram considerados incapazes nas suas escolas porque estavam à frente delas e,
portanto, não podiam ser medidos pelos seus testes. As provas da escola do
passado servem para provar quem está mais adequado ao mundo do passado.
Não deixe que a escola te ensine que você não tem nada a ensinar.
Na escola do passado os alunos são separados em séries de acordo com
suas faixas etárias e isso praticamente impede a interação entre idades
diferentes. Colegas um pouco mais velhos têm muito a te ensinar e, o que é
ainda mais importante, os mais novos têm muito a aprender contigo. E ensinar é
a forma mais eficiente de aprender. Quando um professor detém o monopólio do
ensino, ele te rouba inúmeras oportunidades de aprender ensinando e ensinar
aprendendo.
Não deixe que a escola te ensine que errar
é ruim.
Provas fazem isso o tempo todo, sem que os alunos percebam. Do jeito que
são feitas, elas servem apenas para apontar e punir nossos erros e desperdiçam
a oportunidade de nos ajudar a aprender com eles. O resultado é que aos poucos
vamos nos acostumando a não arriscar e a evitar erros a todo custo. Não há nada
pior para o aprendizado do que o medo de errar. Erre! Erre de novo! Erre à
vontade. Erre quantas vezes forem necessárias até acertar.
Não deixe que a escola te ensine a ser apenas consumidora de ideias.
A escola do passado se limita a ruminar as ideias dos outros.
Diariamente, aula após aula, os alunos mastigam, engolem e digerem um enorme
cardápio de informações. Não há nenhum espaço para que eles gerem conhecimento,
produzam pensamentos, criem ideias, somem.
Os alunos são tratados como se
fossem incapazes disso e logo se convencem dessa incapacidade. O mundo do
futuro é o mundo da troca. Nele, os bem sucedidos não serão os que forem
capazes de acumular mais ideias, mas os que forem capazes de distribuir mais.
Escreva, desenhe, cante, dance, filme, blogue, fotografe, pinte e borde. Crie,
produza, pense, gere, compartilhe.
E o mais importante de tudo, minha filha: não deixe que a escola te
ensine que aprender é a mesma coisa que ser
ensinado.
Toda criança nasce uma esponjinha de conhecimento ávida para
absorver os comos e os porquês de tudo que vê. Essa curiosidade sem fim,
essa fome de aprender costuma durar até o exato momento em que ela passa pela
porta da sala de aula da primeira série da escola do passado.
É nesse momento
que as crianças são convencidas que aprender não é experimentar, sentir e sujar
as mãos de terra ou tinta, como faziam até agora, mas sim sentar
silenciosamente em cadeiras alinhadas e ser ensinado por um professor que é o
dono de todo o saber e que decide sozinho a hora de começar e de parar de
estudar cada assunto.
O aprendizado não vem mais da interação da própria criança com o objeto
que ela está conhecendo. Agora, ele é “transferido”. A criança não faz mais
perguntas, ouve respostas. A busca do conhecimento não começa mais nas
interrogações dos alunos, mas nas afirmações do professor; o estudo não mais se
inicia na curiosidade, mas na autoridade. A criança não está mais no comando do
seu aprendizado, ela não é mais um sujeito ativo no ato de aprender, é um
sujeito passivo do ato de ensinar do professor.
Em resumo, a criança não mais
aprende, é ensinada. Não abra mão da direção da tua vida. Viver é aprender e
você tem autonomia (ou seja, a liberdade e a responsabilidade) para decidir o
que aprender e, portanto, como viver. Não a ceda a ninguém.
Se você conseguir impedir a escola de te ensinar essas coisas, vai
acabar descobrindo que vida escolar é diferente de vida de aprendizado. E
então, terá a vida inteira para desfrutar dessa incrível Era do Conhecimento
que está apenas começando.
Te amo.
Teu pai.”
Postado
por Michel Assali
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